Sobre um novo reacionarismo


Quando se olha para o termo reacionário, para fazer jus ao significado histórico desse termo no seu sentido técnico em pleno 2023, esse termo não deve ser somente destinado aos bufões do assim chamado movimento da “nova direita”, mas deve também ser estendido aos assim chamados “progressistas”.

E a razão por causa disso é a modernidade, pois é um momento em que “tudo o que é sólido se desmancha no ar”, tem-se essa quebra de relações tradicionais e tudo mais. Pois bem, estamos agora testemunhando como um desenvolvimento objetivo da história, das forças de produção e da evolução do capitalismo moderno, um ressurgimento da tradição e seus modos de vida. Sendo este fenômeno não uma simples forma de resistência contra alguma mudança objetiva das forças de produção, na verdade, o que estamos vendo agora é justamente uma resistência contra a tradição.

Por conta disso, as autoproclamadas vertentes progressistas fazem cada vez mais uso daquilo que é popularmente conhecido como o “politicamente correto” e seus afluentes, porque são eles que têm que reagir contra o fato de que a modernidade esgotou a extensão de sua negação, e agora estamos retornando a um ser positivo novamente. Então, no sentido técnico, o autodenominado militante progressista é sim um reacionário, porque este está reagindo contra esse desenvolvimento do objeto da história que estamos presenciando, pendendo a um universalismo abstrato e sua igualdade universal, que é aplicada acima e além da extensão de seu ser real e essencial.

Por exemplo, a modernidade trouxe esse tipo de universalização do cogito cartesiano, onde homens e mulheres são sujeitos modernos com a capacidade de se retirar criticamente de seus contextos tradicionais e paroquiais, possuindo a liberdade de tomar decisões e fazer escolhas diversificadas no campo da ambiguidade. Porém, estamos indo além disso, nós como sujeitos cartesianos ao sermos retirados de nossas circunstâncias particulares por essa modernidade, ainda mantemos essas circunstâncias pois não é algo que simplesmente criamos, a questão é que se começa a tratar esse selo de particularidade como algo reacionário. É requisitado que as premissas de todos os aspectos da vida humana sejam com base em uma consciência moral e racional que alimente uma subjetividade individual. E isso é reacionário.

Quando Marx estava falando sobre as forças progressistas da história e as classes reacionárias, ele não estava falando sobre as pessoas se sentirem incomodadas com certas subculturas inortodoxas que vemos hoje em dia, ele estava falando sobre a indústria e a ciência moderna, assim como a dissolução dos velhos laços tradicionais. Para Marx, o que vem depois disso é uma questão em aberto, ele não estava falando sobre esse fanatismo da negação, como se fosse revolucionário derrubar artificialmente e sinteticamente todas as realidades e relações tradicionais da vida. Marx estava simplesmente dizendo que a modernidade é um desafio para a humanidade, que esta deve enfrentá-la, resolve-la e supera-la.

E foi esse desafio que a União Soviética, China e outros países comunistas decidiram encarar. Um exemplo que ilustra bem a essência disso nestes dois países citados antes, é como ambos responderam a modernidade incentivando a igualdade de gênero, a alfabetização, a educação e assim por diante. Mas, depois de tudo isso resolvido, as mulheres por exemplo, além de terem a opção de seguirem suas carreiras e caminhos como bem entenderem, têm também a escolha, e não somente a escolha, mas a capacidade de expressar sua essência em serem mulheres “tradicionais” no sentido que criam seus filhos, mantém uma vida familiar e tudo mais. A reconciliação em não fazer estes serem incompatíveis foi o que levou o comunismo a ser adotado por diferentes povos como meio de enfrentar a modernidade.

Era uma forma diferente de modernidade, uma forma em que o abstracionismo do sujeito cartesiano não se voltava contra as realidades tradicionais só por estas serem o que são. Era na verdade o contrário, era uma plataforma através da qual elas podiam florescer e até se desenvolver em um grau maior do que antes. Era um completo inverso da modernidade “progressista” que se conhece no mundo ocidental.


1 thought on “Sobre um novo reacionarismo”

Leave a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Scroll to Top